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Escola de Liturgia para jovens aconteceu em Joaçaba – Santa Catarina

31 de Janeiro de 2011 3 comentários

Entre os dias 14 e 23 de janeiro, em Joaçaba, aconteceu a 1ª Escola de liturgia para jovens. Motivados pela formação e pela vivência da espiritualidade litúrgica, reuniram-se aproximadamente 50 jovens de Santa Catarina, de outros estados brasileiros e um jovem do Paraguai. 

Apropriando-se de uma metodologia específica, quatro assessores conduziram os jovens a mergulhar na espiritualidade litúrgica: Édina Cardoso (Casa de Juventude – CAJU, GO); Ir. Penha Carpanedo (Liturgista, SP); Pe. Mirim Borges (Liturgista, MG) e Euri Ferreira (Teólogo e músico, SP).

Essa escola mostrou aos jovens novas perspectivas para a ação litúrgica de nossas comunidades e paróquias, compreendendo que  a liturgia como fonte e cume de toda a ação da Igreja deve ser vivida com todo seu significado, e percebendo nela um sentido, no qual o simbólico transporta a comunidade celebrante para uma realidade divina.

Objetivos específicos da Escola de Liturgia para jovens:

  • Levar a uma experiência de participação litúrgica como fonte de revigoramento da fé e do testemunho;
  • Proporcionar o aprofundamento da liturgia na dimensão teológica, espiritual, ritual e pastoral;
  • Capacitar para a animação da celebração dominical;
  • Buscar uma forma celebrativa orante, jovem e inculturada.

Liturgia e oração, itinerário de uma espiritualidade

Durante a escola, os jovens puderam ter contato com a Liturgia das Horas, também chamada de Ofício Divino. Esta oração que pertence a todo povo de Deus tem suas origens no povo judeu, que ora pela manhã, ao meio-dia e à tarde, elevando o louvor ao Deus da vida. Jesus, sendo judeu, apropriou-se desse jeito de orar ao Pai, com os salmos, a própria Palavra de Deus. As primeiras comunidades cristãs permaneceram nessa tradição a partir da ressurreição de Jesus, associando o fato de rezar pela manhã a Jesus, o sol que nasce e ressuscita, e à tarde, o sol que declina, o mesmo Jesus que sofre com sua paixão.

Atendendendo a uma solicitação da própria constituição conciliar, a Sacrosanctum Concílium, o Ofício Divino, na década de 1980, foi inculturado, isto é, simplificado, o que pode facilitar e devolver às comunidades mais simples um jeito próprio de se rezar, com suas culturas e suas poesias, sua musicalidade e seu jeito de falar.

Pe. Geraldo Leite, já falecido, foi o grande pioneiro nesse processo de inculturação, adequando os salmos pertencentes à Liturgia das Horas a uma linguagem mais popular, com poesia, rima e musicalidade próprias do povo mais simples, já que exercia seu ministério numa comunidade de povo simples e semi-analfabetos. Tal foi a aceitação desse jeito de rezar que, progressivamente, o povo ia se apropriando de uma linguagem própria de falar com Deus, através dos Salmos musicados pelo próprio Pe. Geraldo Leite, dentre outros compositores litúrgicos.

Hoje, muitas comunidades rezam o Ofício Divino, muitos até o utilizam como oração no Dia do Senhor, o Domingo, já que mais de 75% das comunidades no Brasil não têm Eucaristia. É então o Ofício Divino, com seus hinos e salmos, com seus cânticos e preces, que sustenta essas comunidades a seguirem, sendo Igreja, sustentadas pela própria Palavra de Deus.

Outras versões do Ofício Divino foram sendo preparadas e consagradas ao povo, devido a necessidade de um novo jeito de rezar inspirado nas primeiras comunidades cristãs e na tradição da Igreja que tem suas raízes do judaísmo. Surgiram então o Ofício da Juventude e das Crianças e Adolescentes. Na Escola de Liturgia para jovens em Joaçaba, SC, os jovens puderam ter contato com o Ofício Divino da Juventude, rezando sempre duas vezes ao dia, pela manhã e pela tarde, num dia ou outro rezando no término da noite as chamadas “completas”. Foi significativo ver como a juventude consegue rapidamente se empodeirar de um jeito simples de rezar. A seriedade com que se empenharam nesta oração, preparando-se para os diversos ministérios da presidência e da Palavra que requeirem o Ofício Divino, mostra a clareza na fé de uma juventude que sempre busca nas fontes alimento para sua espiritualidade. O Ofício Divino traz em seu bojo essa marca.

Depoimentos:

No decorrer da Escola de Liturgia para jovens perguntamos a três participantes o que acharam desse novo jeito de rezar e de compreender a liturgia como fonte de espiritualidade e força sacramental, alimentando  a vida cristã. Veja abaixo seus depoimentos:

O jovem seminarista da cidade Caçador-SC, Hilton Wozorek, 17 anos, vivendo a experiência de oração com um jeito jovem, afirma que “a noção de voltar às fontes das comunidades primitivas, sugerida pelo Concílio Vaticano II, em que devolve ao povo aquilo que sempre lhe pertenceu, já que por muitos anos o Ofício Divino permaneceu na mão dos padres e monges, vem recheada de uma espiritualidade, pois no Ofício Divino a juventude busca viver uma nova forma de espiritualidade que possa atingir sua vida, que fale de seus anseios e seus temas”. “Não apenas simplesmente como uma mudança de rito, mas como um olhar novo, re-significando o verdadeiro sentido da Liturgia das Horas”, continua Hilton. Para o jovem seminarista, que está no período do propedêutico, no seminário diocesano de Caçador/SC, “experimentando esse jeito novo de rezar com simplicidade, junto a outros jovens de SC, rezar o Ofício Divino faz tocar a profundeza, nesta oração se encontra um estilo que nos faz formar uma espiritualidade, estilo esse que é próprio de Deus, que é beleza, traduzida tão genuinamente pela juventude”. Perguntamos a Hilton o que o Ofício pode provocar na juventude, o que ele afirmou que “a juventude desperta o querer ser Igreja, de participar dessa mesma Igreja, de querer constituir uma espiritualidade, seja nos grupos, seja nas comunidades, mas cada qual ao seu jeito, à sua maneira, com seu rosto específico. Rezando o Ofício a juventude vai beber desse jeito de rezar, o que dá ânimo para ir em frente, seguindo sempre”.

O jovem Vinicius, estudante universitário do interior do Estado de Santa Catarina,  gostou da experiência de ter rezado o Ofício Divino da Juventude. Para ele, se trata de fazer uma experiência muito bonita, que lhe contagiou, de fato, “o Ofício Divino possui uma maneira simples de rezar, em que todos podem fazer”, afirma Vinicius. Dentre as partes da oração, Vinicius diz que o que mais lhe tocou foi a abertura cantada, sobretudo quando quem preside se levanta, e começa a melodia, tocando no mais fundo de quem participa, pois melodia unida à palavra toca mais na gente”. Vinicius acha que todos os participantes da escola de liturgia para a juventude estão gostando da experiência, sempre com vontade de se inteirar, querendo aprender como fazer melhor, pois sentem vontade de fazer do mesmo jeito em sus grupos, em suas comunidades, já que todos vieram com muita sede de rezar e aprender, sempre aprimorando-se.

Ivanete Hammes, diocese de Chapecó, contribui na liturgia com a música e a Palavra e disse que a vivência do Ofício Divino da juventude é o que faltava, pois  já tem experiência de rezá-lo em sua comunidade. Com relação aos estudos e vivências desenvolvidos nos dez dias da escola, afirma:  “nós não sabíamos muitas vezes o que estávamos celebrando, agora é que viemos entender e aprofundar isso; trata-se de uma experiência mais profunda que é manifestada na oração, na palavra e na Eucaristia”. Para Ivanete, o que mais lhe encatou na escola de liturgia para jovens foi “compreender a beleza de celebrar a vida, que acontece mesmo na simplicidade de nossos dias”. Ela, como outros jovens, se sente provocada  por um encatamento pelo projeto de Jesus, pelo seu jeito, para o compromisso com o Reino “a liturgia aponta para esse compromisso”, afirma.

 Entrevista com D. Manoel – Bispo de Chapecó, SC

D. Manoel, bispo de Chapecó, que esteve presente o tempo todo durante os dez dias da escola, me concedeu uma entrevista. Acompanhe abaixo o que o bispo referencial da Liturgia no Regional Sul 4 e ex-presidente da Comissão Episcopal para a Liturgia da CNBB, diz sobre o engajamento da juventude no aprofundamento e no estudo da liturgia como fonte de espiritualidade:

  – D. Manoel, o senhor como bispo da Diocese de Chapecó, qual foi a sua perspectiva, e, na sua opinião o que o motivou a iniciar um processo de formação litúrgica para os jovens pensada em forma de uma escola?

Essa escola de liturgia para a juventude em Joaçaba, por acaso acontece em Joaçaba, mas estava programado para acontecer em Taió, cidade do Estado de Santa Catarina. Na verdade, a escola é promoção da Pastoral da Juventude (PJ) ou das PJs do Estado de Santa Catarina, do Regional Sul 4. Isso era um desejo meu, pessoal, há muito tempo. De repente ela acontece sem a minha interferência, quando o Rodrigo vem e diz que já está até encaminhada, e eu fiquei muito feliz com isso, e enquanto bispo referencial da Comissão de Liturgia no Regional Sul 4, naturalmente dei apoio imediato. Essa escola, portanto, está acontecendo como parceria da Comissão de Liturgia do Regional Sul 4 com a PJ do Regional Sul 4. Naturalmente, eu fico muito feliz porque eu sei da história do movimento litúrgico, fora do Brasil, lá no final do século XIX, começo do século XX, e aqui no Brasil já desde o começo século XX, que começou com jovens, tanto na Europa como aqui no Brasil. E nós, agora, no mundo inteiro e também no Brasil, nós estamos passando por uma situação que alguns teólogos e alguns pastoralistas dizem denominam de inverno na Igreja, e também de inverno na liturgia. E eu espero que esse inverno passe o quanto antes e a primavera logo aconteça, e essa primavera só vai acontecer à medida que os jovens se apaixonarem, como um deles até falou, pela liturgia. Eu sinto esse grupo aqui muito empenhado, muito disposto, são representantes de diversas dioceses do Estado e penso que eles vão para suas dioceses, vão fermentar, e em breve, se Deus quiser, aqui, no nosso Estado, a liturgia vai tomar um vigor muito grande.

D. Manoel João Francisco, bispo da diocese de Chapecó, esteve presente durante os dez dias da Escola de Liturgia para jovens

 – Então, o senhor acredita que o protagonismo da juventude na PJ possa ser uma esperança para esse engajamento litúrgico, e essa esperança de que se passe esse inverno e de que se chegue a um verão ou a uma primavera litúrgica possa ser alcançada através da juventude?

Eu acredito sim que através das PJs, mas dos jovens em geral, porque também tem os jovens de outros movimentos e pastorais da Igreja, que querem também ser Igreja, e desde que esses jovens sejam bem orientados, e também os dos movimentos, pois na minha opinião os jovens desses movimentos liturgicamente não são bem orientados, como como os da PJ também, até o momento. Agora é que começa a ter uma orientação um pouco mais fundamentada, mais consistente. Por isso penso que a juventude é a esperança da Igreja, então precisamos investir nos jovens, tantos nos engajados nas PJs quanto os jovens engajados nos movimentos e pastorais da Igreja.

– Um recado final que o senhor gostaria de falar aos jovens do Brasil, aos da Pastoral da Juventude, principalmente aos jovens engajados na Igreja e aos jovens cristãos católicos.

Gostaria de dizer aos jovens em relação à liturgia que, se eu quero transformar a minha vida de cristão e de cristão católico, eu devo começar a cultivar dentro de mim uma espiritualidade litúrgica. E se eu quero transformar uma comunidade, uma paróquia, uma diocese, e mesmo a Igreja, eu devo começar pela liturgia. Foi assim que o Concílio Vaticano II se propôs. E o primeiro documento do CV II é o documento sobre liturgia, e a primeira frase desse documento coloca os quatro objetivos do próprio Concílio, sendo dois ad extra e dois ad intra. Depois de colocar esses quatro objetivos, diz: “por isso nós resolvemos começar pela reforma litúrgica”, ora, a reforma litúrgica é que vai dar início, vai deslanchar toda uma reforma da Igreja inteira, assim pensaram os bispos no CV II, que eram praticamente 3 mil. E faz parte de nossa fé católica, que quando os bispos estão reunidos em concílio, sob a presidência do papa, tem uma assistência especial do Espírito Santo. Sempre a Igreja é guiada pelo Espírito Santo, mas com essa assistência especial do Espírito Santo os bispos começaram pela liturgia para a reforma de toda a Igreja. Por isso, também nós, ao meu modo de ver, se queremos começar com a nossa mudança pessoal, a nossa conversão pessoal, e depois do nosso meio ambiente, devemos assumir uma espiritualidade embasada e alimentada pela liturgia.